quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Da infinitude dos signos



"Mas na noite opaca, Jeremias vê. E sua visão é uma boa visão:

A palavra do Eterno se dirigiu a mim nestes termos: O que tu vês, Jeremias?
Respondi: Vi um ramo de árvore agitando-se fortemente, como se estivesse com pressa.
Tu bem o vistes, me disse o Eterno. Vou me apressar em realizar minha palavra.

( Jeremias, 1, II, 12).

Jeremias viu apenas um galho de amoreira mas, por tê-lo visto, ele lhe penetrou a significação. Através do reflexo, ele atingiu a luz. A visão profética desvela a essência das coisas. Por vinte vezes Jeremias viu florir a amoreira, em seu rincão natal; por vinte vezes, era o anúncio da primavera. Mas hoje, o tempo se lança, em uma turbilhonante viração, que subitamente se torna uma “pressa”, uma precipitação do caule à folha, da folha à flor, da flor ao fruto, a pressa de Deus em fazer sua Palavra amadurecer. A amoreira, a palavra que a designa, o elemento de que é feito, o lugar que ocupa, o momento onde esta aparece, o crescimento que a anima, tudo o que designa o objeto à compreensão humana: linguagem, matéria, espaço, tempo, vida, tudo isto significa, tudo é signo. A visão normal é designação. A visão profética é signação ( mostração).Da nomenclatura segundo a ordem humana, do catálogo das coisas, surgem inopinadamente valores (...) A visão profética tem, é certo, por fundamento a concepção hebraica do concreto, do sensível”.

Andre Neher, Essência do profetismo


“A significação do sensível se explica pelo fato de que este foi criado por uma palavra; o sensível é em si mesmo uma linguagem, a manifestação substancial de uma palavra criadora... Os elementos sensíveis significam. Toda a criação é como um registro onde os elementos constituem palavras subsistentes. Os escritores bíblicos jogam com esta série de arpejos simbólicos com uma espantosa coerência. Eles utilizam, por assim dizer, o mesmo instrumento elementar, os mesmos registros, a mesma chave( musical), e as variações se fazem segundo um código, um contraponto que conserva ao elemento significante seu sentido originário”.

Claude Tresmontant, Ensaio sobre o pensamento hebraico.


“En un mot, toute communication de contenus spirituels est un langage, la comunication verbale n’étant q’un cas particulier, celui du langage humaine et de ce qui le fonde ou se fonde sur lui ( justice, poésie). Mais l’existence du langage ne s’étend pas seulement à tous les domaines d’expression de l’esprit humain, lesquels, em un certain sens, font toujours place au langage; elle s’étend absolument à tout. Ni dans la nature animée ni dans la nature inanimée il n’existe événement ni chose qui, d’une certaine façon, n’ait part au langage, car à l’un comme à l’autre Il est essentiel de communiquer son contenu spirituel. (...) l’homme communique sa propre essence spirituelle ( autant qu’elle est communicable) em nommant toutes les autres choses. (…) nous ne connaissons, en dehors du langage humaine, aucun langage qui nomme; (…) ainsi, l’essence lingüistique de l’homme consiste en ce qu’il nomme les choses. (…) L’homme communique-t-il son essence spirituelle par les noms qu’il donne aux choses, ou bien dans ces noms? Le paradoxe de la question contient la réponse. Croire que l’homme communique son essence spirituelle par les noms, c’est s’interdire de supposer que l’homme communique réellement son essence spirituelle,- car cela ne se fait point par des noms des choses, autrement dit cela ne se fait pas par des mots que lui serviraient à designer une chose. Et alors il peut admettre seulement ceci: qu’il communique quelque chose à d’autres homes, car cela se fait par le mot que me sert à designer une chose. Cette vue est la conception bourgeoise du langage, don’t la suite va montrer de plus en plus clairement le caractère intenable et vide. Cette vue consiste à dire: le moyen de la communication est le mot, son objet est la chose, son destinataire est l’homme. L’autre conception ne connaît ni moyen, ni objet, ni destinataire de la communication. Elle dit: dans le nom l’essence spirituelle de l’homme s’adresse à Dieu”.

Walter Benjamin, Sobre a linguagem em geral e a linguagem em particular


"L’hébreu porte donc, comme des débris, les marques de la nomination première”.(...)Sous sa forme première, quand il fut donné aux hommes par Dieu lui-même, le langage était un signe des choses absolument certain et transparent, parce qu’il leur ressemblait. (...) Cette transparence fut détruite à Babel pour la punition des hommes(...) Toutes les langues que nous connaissons, nous ne les parlons maintenant que sur fond de cette similitude pérdue, et dans l’espace qu’elle a laissé vide. Il n’y a qu’une langue qui en garde la mémoire, parce qu’elle derive tout droit de ce premier vocabulaire maintenant oublié…"

Michel Foucault, Les mots et les choses



“La tradition mystique juive voit dans le mot l’expression immanente de la chose.Il n’établit pas seulement un lien avec le reel, ne fonde pas seulement notre rapport à la chose dans une sorte de disponibilité permanente: plus qu’un rapport de connexion, il vise la similitude, la resemblance. L’hébreu atteindrait la réalité dans son Coeur parce qu’il est le “reflet du langage créateur de Dieu”, et portant l’instrument de la connaissance parfaite de sa Création”.

David Banon, La lecture infinie


Agora, Júnior:


Um décimo primeiro mandamento: interdição do símbolo! A decadência da linguagem em comunicação ( meio de) , em instrumento de e suporte para um significado alheio ( e geralmente transcendente) à coisa que a linguagem deveria exprimir; ou antes: conter a coisa, como um escrínio a uma jóia, como uma elegia a um morto. Como uma placenta a um por-vir; minha cunhada está grávida, e me comoveu saber que, em apenas um mês, suas arestas e curvas já foram devidamente alinhadas e suavizadas para aconchegar o fruto. Como se houvesse uma cumplicidade, misteriosa e irremissível, entre o presente e o futuro - uma nesga de futuro, mas também com um rastro de passado, pois um filho é a conjugação e a foz de um maciço planalto de mortos, de todos os nossos mortos. Só um delírio aqui, mas a metáfora, a mais digna das invenções humanas- já escrevi em algum lugar os motivos: ela é de natureza cognitiva, dá a conhecer, pois é a síntese de uma analogia entre coisas, ou estados de coisas; e ao mesmo tempo ela dá a ver, mostra: epifania- tem, na minha cabeçorra delirante, o mesmo papel cumprido pelo útero de Adriana: ela aninha e aconchega o signo, ela o preserva, mas não o conserva, paralisa. Pelo contrário: o ser escrínio ou guardião da metáfora reserva ao signo um mundo de associações que não cabem ( não caberão) em nenhum presente. Assim como o útero ao filho- nativivo e já possivelmente um Outro em sua primeira e incerta floração-, a metáfora sacraliza a palavra; ela a separa ( tabu) do mundo instrumental e funcional, do comércio dos homens idos e vividos. Como bem diz o trecho acima, ela retira o signo da “condição de disponibilidade permanente” para o uso e abuso da alienação ( ou comunicação). Ou seja: ela ainda mantém as características da linguagem originária, da nomeação das coisas por Deus: nomeação mimética, na qual o nome presenta direta e absolutamente a natureza da coisa, sua essência.

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